segunda-feira, 16 de abril de 2012

Enfraquecida, Guiné-Bissau, nomeada pela ONU de Narco-Estado, cai para militares

 
      Guiné-Bissau tem uma longa história de derramamento de sangue, colônia e entreposto negreiro até o Século XIX, acabou por se tornar entreposto do narcotráfico sul-americano com destino a Europa no Séc. XXI, de território controlado pela coroa portuguesa até recentemente, conseguiu sua independência declarada em setembro de 1973 e que só teve reconhecimento em Portugal após a Revolução democrática dos Cravos em setembro 1974 no país português e que trouxe também uma democracia manca ao país africano.




    Mas no último dia 12 de abril de 2012 o regime parece ter tomado um passo para um regime muito menos democrático, e está sendo até visado por teocratas jihadistas da Irmandade Islâmica, em grande parte devido à influência do mercado ilegal das drogas no país e pelo fato do país estar mergulhado no conflito denunciado aqui mesmo neste blog e pelo nosso grupo de cultivadores de cannabis conscientes e desejosos de mudança na legislação, a perversa política de combate armado ao tráfico de drogas, a Guerra às drogas (termo cunhado por Richard Nixon em discurso proibicionista no ano de 1971) e que de fato contribuiu, e muito para a degradação do país como um todo devido o aumento no preço dessas drogas, e consequente aumento do poder e capital dos monopolistas do comércio de drogas, o crime organizado, traficantes de armas e drogas, assim como comprometimento do Estado com custo de segurança, construção de prisões, armamento policial, processamento penal de criminosos envolvidos no tráfico, etc.


    Por localização geográfica, o país serviu de hub para os navios negreiros, hoje é hub para o bilionário tráfico internacional de drogas.



     O pequeno país lusófono de mais ou menos um milhão e meio de habitantes é violento, já sofreu de inúmeros conflitos, um golpe de Estado, teve seu presidente João Bernardo Vieira assassinado em março de 2009; E finalmente, possui péssimos indicadores sociais (de 187 países listados no IDH, fica na 176ª posição), alfabetização de menos de 45% da população, expectativa de vida de 46 anos na média e que recentemente, segundo relatório da própria ONU, tinha se tornado o primeiro Narco-Estado do planeta, cujo valor da movimentação de drogas ilegais tinha ultrapassado os 18 bilhões de dólares, valor equivalente a, pasmem, mais de 15 vezes o valor do PIB nacional do país de 1,2 bi.


Traficantes preparam cápsulas de cocaína para 'mula' engolir. Foto da revista Time por MARCO VERNASCHI 



     Com os valores mencionados o crime organizado pode facilmente influenciar e mudar o destino da política de um país com Estado enfraquecido, na década de 80 Pablo Escobar, homem mais poderoso da Colômbia, enriqueceu com o mercado americano pagando em dólar, e comprou todos oficiais, militares de alto escalão que necessitou para transportar toneladas de cocaína para os EUA, e trazer os mesmos aviões cheios de toneladas de dinheiro dos EUA de volta para a Colômbia. Agora isso aconteceu na Guiné, e o golpe já era esperado por nativos e intelectuais.


Viciado em crack morador de Guiné-Bissau, país teve uma explosão em violência doméstica e consumo de drogas perigosas na última década.


 O acadêmico de Guiné-Bissau Fafali Kudawo por exemplo, disse em 2009 o seguinte sobre o tráfico: "O risco é que eles terão uma profunda penetração de dinheiro sujo na política, porque esse país é muito, muito frágil, e aquele que tem dinheiro pode fazer o que ele quiser. Você nunca sabe em nenhum momento o que irá mudar a situação ou levar o país à guerra ou à violência".


Protesto contra a violência na capital Bissau.


    Essa influência é sentida profundamente na sociedade, e o que Fafali temia parece ter se tornado realidade em pouco mais de três anos, o Narco-Estado foi tomado por militares, financiados e controlados por pessoas de origem desconhecida, e somente um louco poderia afirmar com certeza o que acontecerá em seguida no pequeno país, nos próximos dias podemos no máximo especular que sangue será derramado, mais pessoas serão mortas, e que um regime muito pior pode surgir dos escombros dessa acabada democracia, também podemos especular sobre quem estaria por trás de tal golpe de Estado e quem liderará o país no futuro, e só cenários mais obscuros tomariam nossas mentes, num país tão sectarizado, rachado culturalmente e pobre. São esses momentos que aproximam perigosamente o realismo do pessimismo. Situações onde 'direitos humanos' são somente palavras vazias, que devemos refletir nosso papel na sociedade atual. O papel de meros espectadores do espetáculo não é suficiente, pois se não nos virarmos à política, ela se virará para nós.



          Militares guineses após golpe, o país se encontrava em processo de eleição, e o candidato favorito não agradava generais.


      Nos resta o quê então? Continuar denunciando a Guerra às drogas por seu fracasso? A maneira como ela fomenta mortes fúteis e debocha da democracia?! Diante da retórica proibicionista insistente dos estadistas latinos presentes na Cúpula das Américas, apoiando a política de combate, diante do fato de que a América Latina é a região mais violenta do mundo, nos resta lutar por uma mudança nas brutais e irracionais leis que mergulham cada vez mais nosso continente num banho de sangue, o anti-proibicionista deve ser, como colocou brilhantemente Freud em "O futuro de uma Ilusão", como servos do deus Logos (do latim lógica ou razão), cuja voz, por apagada que seja, é insistente e não descansa enquanto não se faz ouvir, não se deixar abalar pela indiferença; A dormência atual precisa ser a motivação de amanhã para nos articularmos cada vez mais, e para no futuro conseguirmos nosso objetivo, que é a regulamentação justa e razoável das drogas hoje consideradas ilegais, e evitar o derramamento de sangue sem sentido que representa a Guerra às drogas; Custe o que custar.